Modcenter: Uma história que não deu certo

Há vários anos atrás o grupo IGN tinha em seu portfólio de sites um site tímido conhecido como ModCenter.com. Esse site utilizava a estrutura do http://sourceforge.net para fornecer um serviço dedicado para os criadores de mods e de jogos independentes.

Por cerca de dois anos o serviço funcionou fornecendo um grande serviço para aqueles que precisavam e conheciam. Muitos dos recursos que considero essenciais para o bom andamento de projetos atualmente estavam disponíveis para quem tivesse boas idéias.

O interessante do serviço na verdade era o fato de criar uma comunidade de pessoas interessadas em criar esses artefatos relacionados a jogos eletrônicos. E se existe algo que pode dar certo é investir em uma comunidade.

Mas essa história não acaba bem, ow não! Mesmo com um crescimento significativo e com uma boa promoção acontecendo dentre a comunidade a crise econômica de 2007 derrubou o site. Aparentemente custa caro fornecer ferramentas gratuitas para cada vez mais gente. E a verdade é que eles deviam gastar mais dinheiro com publicidade do que recuperar com a publicidade que o ModCenter gerava para a rede deles. E por mais que falemos de nobres intenções, essas estão reservadas a pessoas com muito dinheiro ou empresas filantrópicas, e a IGN não é nenhuma das duas.

Eu senti essa perda porque era uma forma fácil e grátis de criar toda a infra-estrutura para administrar projetos. Claro que sempre existirá o SourceForge caso você queira criar um projeto de código aberto com as mesmas ferramentas. E não me entenda mal, a maior parte dos projetos no SourceForge são de jogos, mas não é a mesma coisa que uma comunidade dedicada. Ter um lar ajuda muito para encontrar outras pessoas que compartilham esse lar. E um lar tem que ter uma temática, uma cara da comunidade que ele abriga.

Mais uma coisa: As ferramentas que acredito que são fenomenais para administrar um projeto atualmente são:
- Wiki Interna: Onde os membros do projeto podem opinar sobre os recursos do jogo dentre a própria equipe e apenas a equipe.
- Wiki Externa: Onde os jogadores podem descrevem as impressões deles sobre o quê você já fez. Percepção do público sobre o quê foi feito é importante.
- Versionamento: Uma ferramenta de versionamento de código é fundamental para qualquer projeto com mais de uma pessoa trabalhando, e muito útil mesmo em projetos individuais. Particularmente recomendo o SubVersion (SVN) mas já ouvi boas coisas sobre o Git.
- Forum: Nada melhor para criar uma comunidade viva do quê um lugar para as pessoas falaram e conviverem umas com as outras.

Vale lembrar que aqui falo de ferramentas para administrar um projeto, mas considero a comunidade uma parte essencial de qualquer projeto independente. Eles serão seus maiores agentes de marketing e a parte mais importante do que você está criando.

Complexo do Complicado

Não sei quanto a vocês, mas por muito tempo eu sofri de um problema sério com meus projetos: a complexidade. Explico: você cria uma ideia e vai agregando coisas a ela. Implementa-se um conceito, buscam-se referencias, criam-se histórias e a bola de neve só vai aumentando... depois, quando chega a hora de ver a coisa sair do papel, a bola de neve ficou tão grande que a única saída é deixá-la lá, rolando montanha a baixo, por que se ela resolver parar em alguma coisa, o estrago vai ser gigantesco.

Quando comecei a trabalhar com a idéia de desenvolver games foi por que tinha um projeto em mente que acreditava ser um ideal de jogo, algo completamente diferente do que havia de proposto no mercado e que ele seria capaz de ser realizado. A dureza da realidade me mostrou, em pouquíssimo tempo, diga-se de passagem, que as coisas não funcionam bem assim: limitações técnicas, humanas e, claro, abraçando estas duas, a orçamentária.

Em 2007, quando em uma reunião de amigos jogando Metal Gear Solid 3: Snake Eater, Daniel e eu iniciamos uma brincadeira: vamos criar um jogo tão bom quanto ou melhor do quê este! Claro, foi algo impraticável e, com o tempo, percebemos que esse sonho deveria ter asas menores a principio para que, depois de muito suor, sangue e lágrimas, pudesse se tornar algo grandioso.

Snake, se você soubesse o trauma que nos causou...

Mas por que digo isso tudo? Recentemente um amigo veio até minha mesa com uma ideia para um jogo. De alguma forma, google?, ele descobriu que eu estudo esse tipo de coisa por fora e que tenho a Nuclear Core Studios como atividade extra-curricular. O problema foi que, apesar da ideia interessante que ele tinha, eu consegui lhe mostrar que a ideia era inviável no curto prazo, como ele tanto idealizava. As coisas não são tão simples... ou será que são?

Calma, eu não falei por três parágrafos sobre como foi difícil minha vida até agora para me contradizer. Na verdade, listei apenas uma sucessão de eventos muito comuns entre os desenvolvedores novos, algo que chamo de "Complexo do Complicado".

Em tese, a raça humana tem na cabeça que nada é simples ao ponto do que lhe aparenta. É muito comum, ao ouvirmos alguém queixar-se de um problema e sugerirmos uma solução, termos como resposta algo do tipo: "não é tão simples assim..." No mundo dos games isso parece se alastrar com uma certa facilidade pelas fases iniciais do desenvolvimento. Quantas vezes você começa a escrever uma história, com várias idéias na cabeça, mas nenhuma sai no papel porque a coisa, simples e ironicamente, se complica demais?

O Complexo do Complicado preciso de um nome melhor para isso, trata justamente disso: temos essa essência humana de que as coisas são muito mais complicadas do que elas aparentam ser e costumamos passar esse nível de complexidade para as coisas com as quais nos empenhamos. Games não são excessão: os estágios iniciais de um projeto sempre são acompanhados de idéias mirabolantes e que são, em primeiro momento, excepcionais.

No caso do exemplo, esse amigo surgia com uma ideia de um jogo onde o personagem principal é o representante de uma raça metamorfa: meio-humano, meio-dragão. Dizia ele que durante o jogo, o personagem se transformaria em qualquer uma das duas formas à medida que fosse necessário e que isso seria um complemento para a jogabilildade.

O problema surgiu quando eu pedi um exemplo de situação em que o jogador seria obrigado a escolher entre uma das formas - isso por que, se você dá ao jogador a liberdade de escolher entre duas formas livres de jogabilidade não implica, necessariamente, que ele irá usar as duas para completar o jogo e, portanto, uma delas pode se tornar obsoleta. MMORPGs sofrem muito desse tipo de problemática quando pensamos na diversidade imposta de classes, tipos de personagens, entre outros. Sim, a proposta é diferenciada, mas perceba que se temos dois jogadores que procuram ser ágeis, o personagem que é, basicamente robusto e lento, nunca será usado por eles. A longo prazo, existe a grande possibilidade de que muitos jogadores escolham ser ágeis e que, por algum motivo, o personagem lento seja descartado.

World Of Warcraft - Eu sempre acho que há mais magos do que guerreiros...

É um discurso enfadonho, eu sei, mas é necessário se você busca um projeto sustentável. Digo isso pois, como o exemplo de meu amigo, existem muitas idéias boas por ai, mas poucas com aplicações práticas. Ter um roteiro de 233 páginas com inúmeras viradas de trama, 30 personagens diferentes e 50 cenários não é algo vantajoso se você não sabe usá-los corretamente - muito menos se forem inaplicáveis financeiramente.

Ah, sim, o critério financeiro. O desenvolvimento de um game é um projeto e, como qualquer outro empreendimento, demanda dinheiro. Horas a fio pensando em como utilizar uma determinada ideia é algo bom, ajuda a combater o Complexo do Complicado realmente eu preciso de um nome melhor que mencionei, mas pode ser desgastante financeiramente: pessoas trabalhando em uma ideia precisam ser pagas, ninguém faz nada de graça e por amor, é a lei da vida. (lembram-se de que nada é simples? pois é... That bitch bites, man.)


No desenvolvimento inicial de games é muito importante a qualidade das idéias. A nossa criatividade é ilimitada e o Complexo de Complexidade sempre estará lá, pois vivemos coisas aparentemente complicadas e queremos que isso também seja aplicável à nossos empenhos - devemos, contudo, avaliar se ser complicado é o que vale a pena ou se a simplicidade faz mais sentido.

Narrativa Vs Experiência

Vou começar esse post de forma direta: Jogos são experiências. O jogo não é necessariamente uma história, mas ele é necessariamente algo com a qual se interage, no qual se experimenta uma série de eventos. Por maior que essa abstração seja, a experiência de situações acontece.

A narrativa de jogos tem o propósito de amplificar a imersão na experiência que está sendo criada. Uma narrativa bem realizada amplificará o sentimento de que o jogador faz parte daquele mundo. A narrativa mal feita pode sim destruir a imersão e jogar a experiência do jogador pela janela, mas a ausência dela de forma explícita, através de narração de eventos, diálogos ou vídeos de eventos, não compromete necessariamente a imersão.

O jogo que me fez escrever esse texto foi Deus Ex: Human Revolution. Não se preocupe, não vou dar spoilers. Tudo que direi sobre ele é que o mundo é incrivelmente bem realizado, tanto que quando a história se encerra sobraram tantas perguntas que eu fiquei frustrado pelo mundo ser tão rico. O jogo é muito bom, a experiência é incrível, mas a conclusão do enredo foi no mínimo fraca na minha opinião.

Deus Ex: Human Revolution

Geralmente a função real da narrativa em um jogo é justificar o porquê as coisas são como são naquela realidade proposta. Isso não é estritamente verdade o tempo todo mas é um bom ponto de começo. Explicar de onde as coisas que não conhecemos vem é o principal propósito das histórias desde o início da difusão dos contos e prosas. Dessa forma pelo menos não precisamos recorrer a techno-babble (ou ladainha tecnológica) para explicar porque aquilo funciona.

No fim das contas o quê realmente importa é a diversão do jogador. O que me resta fazer é lembrá-los que o único meio capaz de oferecer experiências são os jogos, enquanto todos os outros meios podem oferecer narrativas. Histórias junto da experiência podem ser fantásticas mas no fim do dia o quê os jogadores buscam é uma experiência enriquecedora e interessante.
 
Nuclear Core Studios © 2010 | Designed by Trucks, in collaboration with MW3, Broadway Tickets, and Distubed Tour. Customizado por Bruna Lanzillotta.